segunda-feira, 28 de novembro de 2011


O garoto libertino espirra gotas de água benta em bundinhas salpicadas de suor.
O garoto libertino amarra o trovão no falo e pede que Baco o arremesse em direção ao convento.
O garoto libertino não sabe gozar em segredo.
O garoto libertino atira farpas em corpos alheios,
Segura na cauda de um trovão,
Amanhece sujo em uma mesa de dissecação abraçado a uma máquina de costura e coberto por um guarda chuva.
O garoto libertino sufoca os ânus alheios com sabedoria e desprezo pela castidade.
O garoto libertino toma conhaque em navios piratas e acaba na cama com a mulher do capitão.
O garoto libertino não acredita na salvação
Só na escatologia. 

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

o menino experimental benze o relâmpago

à Murilo Mendes que inicia o caos



abençoo tua carne de sal e sonho.
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abençoo tua vulva de gelatina e glúten e pólen.
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abençoo tuas olheiras nascidas das noites insones onde concebemos sacanagens em silêncio. onde masturbamos  o caos e abençoamos os olhos vermelhos dos inimigos cansados de serem pendurados em estrelas. onde rezamos para os fantasmas e proclamamos o fel na enorme língua que lambe o mundo inteiro e o infinito. onde chutamos os concretos das almas alheias. onde prendemos pipas de celofane nos caralhos dos deuses. onde pedimos para os vermes comerem logo nossos mortos e para as virgens comerem os herméticos. onde assustamos borboletas com o cajado. onde os filhos não são ingratos. onde o infinito cabe nas asas das borboletas assustadas e as olheiras são límpidas como os relâmpagos.
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abençoo teu caos
 teus cavalos escondidos nos sapatos
tua mão de gaita polonesa revestida com pele de tatu
tua vulva lancinante vacinada de espermas
tua tumba taoísta que trama ao telefone
                                                   abençoe, portanto,
minha língua há de vir.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

temos perdido um a um:

e quase sinto tua voz
          na bruma das coisas
e é tua,
tinha que ser.
        as coisas tão ditas
                      tantos dois ou três
                      anjos molhados
na bruma das coisas
com letras laços lenços
e o pesado
cheiro de vodka
que nunca pagaremos,
                que nos ferimos demais,
que foi longe demais,
sangrando demais,
sob a ponte do perecível.

domingo, 4 de setembro de 2011

não some, que esse beijo que agora coméço é para não acabar nunca

se os anjos não querem saber de nós,
            quero saber de ti
                   postas-te assim, deitas à mesa,
(com as velhas urtigas das calcinhas viscolaycra)
                     coçando a margaridinha como se  me chamasse
por sobre teu corpo de carne
              então vê se "não some não, amor"
pra que eu possa passar meu pólen
                                             por sobre a tua flor
& meu dedo há de estar
 hora ou outra
                em seu mamilo
                   e que eu revolvido de teu corpo que é carne
                                                   sobre a mesa
                                                             tenha certeza
                                                                 de que tua entrega seja aquela de fecunda fêmea
                                                                                  abraçada ao rancor dos abraços do gozo
                                                   

Após  alguns  poemas de Herberto Helder
                                         

Chuva Princesa

corpo de girassol
           vou te levar pra voar
assim que teus cabelos
   forem iguais aos cabelos da chuva
                      e quando pairarmos sobre as nuvens negras
vou lamber
a lua no canto da sua boca
                vermelhinha de framboesa
e no céu estourarão foguetes nus
                                que pousarão sobre teu corpo de bacante.

Após reouvir Chuva Princesa, Mautner                               

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

aos visionários


“eu fiz um pacto com a prostituição,
Afim de semear a desordem entre as famílias”

Lautréamont
Quando todos se cansarem
da cólera
         dos cães
                da chuva
Maldoror estará com seu cajado
                 enterrado na vagina do mundo
sobre o montes celestiais
                        observando a miséria da humanidade
cantando canções de caos
                 comendo maçãs com vermes
 & o pacto da prostituição dos homens
       roerá o que sobrou de nós,
os filhos da babilônia,
nós,
os miseráveis sanguinários,
                que escrevemos seus cantos
em paredes de quartos alheios
     com o sangue menstrual das virgens
de Sodoma,
nós,
os anjos bestiais,
         filhos de Maldoror,
cantamos o ovo do cosmos
                   para explicar a doença
dos olhos de barro de Mondigliani,
              para uivar sobre os esqueletos de Bruegel,
para ninar nossas ninfas
& abençoar a louca paixão de Lorca
por Dali.   

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

eu canto

“após reler poema XXXII da Invenção de Orfeu
& Lorca”
para ler
ao compasso de Libertango, Piazzolla
Os sete olhos de Jorge de Lima atestam:
a fome dos navios
              ancorados nas costas de Murilo Mendes.
guindastes agonizando o falos da morte
não deixavam a velha fumante dormir
& nem o seu cachimbo
& nem o seu aborto
& ele ainda inventava o Orfeu
            ele ainda sonhava com notas celestiais
vindas de pianos bacantes
ancorava seu navio no espaço
com um acerto crasso
a um passo da morte
            as erupções corporíferas
 e as células de poesia e delírio
do garoto bêbado caído nos sonhos
de vazio
das tardes torpes e insolentes
& ele me disse que era o pão e o vinho
 disse que cultuava Breton, Artaud,
 Rimbaud  
    com palhaços da infância jogados no vazio

ele uivava pelas ruas surrealistas
alertando os ouvidos das pétalas
enquanto eu lia Lorca
                      & o dois era a guitarra onde o amor se desespera
                     enquanto eu tinha fome
& mães ciumentas que me acariciavam
eu – o feto embriagado –
porque sou todavia violento
porque sacudo o corpo em direção ao sol
porque uso ácidos
porque sou rebelde
anarquista
& o palhaço.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

esposa morta.

Todas as múmias pegaram os buquês de lesma & imortalizaram os olhos de celofane por todo o condado. Allen Ginsberg gritando aos ouvidos de todos que havia experimentado todas as drogas inventadas por Burroughs e W. B., citado anteriormente, atirando em cheio na massa cefálica de sua amada. amor de junkie é tiro direto na testa. A mulher morta em New México é o fardo do eterno hipster, um estalo um estouro no meio da cabeça da esposa junkie. Reclamando seu garoto chupador, reclamando do excesso como fonte de irradiações noturnas. Todas as múmias adoram o William Burroughs e comem seus buquês de lesma no café da manhã. A mulher morta provavelmente estava encostada em uma árvore tipicamente americana com um vestido branco sujo de retina. a mulher morreu com um tiro a testa dado por seu marido como uma boa esposa burguesa.       

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Ao ler um conto de Joyce

Para ler ao som de And it’s all over now, Baby Blue

Ela se sentava como se fingisse para ele não que ela era como se uma acácia caída ali em  seu quarto como por um milagre frente a seus olhos ateus. Ela deitou-se a seu lado e pediu que ele simplesmente deixasse de ler por um segundo e ficasse com ela em mais um intervalo de leitura. E quando olhou em seus olhos era como se eles fossem tudo que no mundo existe, ou como se o sol brotasse ali nos dois dos seis buracos que ela tinha no rosto. Ele queria tê-la sempre assim, como uma acácia-tudo-sol-deitada-a-seu-lado, mas ela levantou-se e voltou a ler na escrivaninha que fica em frente a janela e ele voltou a ler os contos de Joyce, como se nada tivesse acontecido.      

quarta-feira, 27 de julho de 2011

"quando era menor
eu me perguntava como deveria ser
a vida nessas casas a beira da estrada
tristes, isoladas...
acho que agora eu sei..."

uma letra agonizante, um trecho que arrepia, "não existe em mim nenhum medo".

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Piva+Murilo+Ana C.

os cometas no coração
florecem
como margaridinhas ínfimas
em seus olhos
      de jabuticaba
eu estou alado:
     cometas
com amor gritando
pelos poros.


eis a iniciação:
  ciúme do vento
que lambe seu rosto
  na noite lilás,
pois não é o amor
aquele que deseja o impossível:
que se apaguem
as marcas n’alma
daqueles
que já a tocaram
por medo que
             as bocas anteriores
fossem mais avassaladoras,
para sua alma,
que a minha boca infame.

bilhete a respeito das unhas

Amor,

pus suas unhas no tempo e, por descuido, elas criaram asas e voaram para deus-sabe-lá-onde. não foi minha culpa. não queria seus dedos desprotegidos nesse inverno. sei bem que logo agosto vai chegar com ele os cachorros da chuva e os meninos benzedeiras de relâmpagos. elas voaram num instante, rapidamente, as asas brotaram ali e elas agilmente desprenderam-se dos pregadores e voaram. será o meu desgosto eterno esse meu querer fazer o mimo e tudo dar errado como nesse momento em que saí no quintal da minha alma e vi elas voando em direção ao sol com lancheirinhas cheias de minúsculas amêndoas para se reabastecer no caminho, ao que me parece, um árduo caminho. recolhi meus apatrechos de caça para buscá-las, mas elas são realmente fortes e acabaram por rasgar a fina rede de meu instrumento. não se zangue, não se zangue, não pude evitar, era apenas um mimo.

Pérsio Gonzales       

terça-feira, 31 de maio de 2011

algumas palavras para não sabotar o nosso amor singelo

Postulados flácidos. Eu que quis te ter assim e mesmo e sempre. você foi embora no carro a 40 kms por hora e eu fiquei ali imóvel na neblina que começa a jorrar sobre nossos corpos naquela manhã de maio. E maio estava acabando e anunciava o começo de junho e de mais um mês a seu lado. os Andes acho que ficam para o ano que vem, nós não temos dinheiro, nós não temos praticamente nada a não ser uma cama quebrada, alguns livros que guardo comigo, alguns cigarros que fumamos durante o fim de semana guardados num copo, uma cuia que nunca usamos e que fica sobre a escrivaninha em que lemos e comentamos nossas leituras um para o outro, uns poucos cotonetes rosados, e alguma vontade de estar sempre por perto um do outro. Você foi ali com aquele carro que eu te dei. Eu guardo algumas notas para você, eu guardo alguns sorrisos e algumas carícias para não sabotar o nosso amor singelo. Nós estávamos ali naquela manhã do ultimo dia de maio. E não havia flores e eu deixei o carro em suas mãos e você ficou ali esperando que eu tivesse alguma carona ou algo do tipo para fugir do mundo que tanto adoramos. Eu te quero cada vez mais e te espero por ali parado no cais, no porto, louco de vontade que você chegue e se achegue logo no peito.  

terça-feira, 24 de maio de 2011

Baco dança
um tango num filme de Pasolini
                      ele que te queria manco,
ela que fuma pelos cantos
                 os versos, os prantos,
     & eu que te quero tanto
almoço, janto
na cabeça da anta
“o movimento dos quadris febris”
os movimentos organizados
para subverter o pudor
                            o fervor,
                                 o amor
                                     quero comer tua mão
                                            quero ser tua oração
                                       aos sábados.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Fragmento I


a vida, baby, passa tenderosa:


 o vinho dentro da garrafa, o sangue dentro do corpo entre outras coisas calmas. você não é uma alucinação, é uma estrela-peixe no meu aquário em saturno. o vinho escorrendo no sangue. baby, o tempo passa calmo e nem um mundo adulto será capaz de nos tornar rançosos como aqueles senhores e suas gastrites hemorróidas sangue-água. nós seguimos à galope nos cavalos da rebeldia seguindo a risca os preceitos básicos rimbaudianos, usando referências bêbadas e levando em nossos olhos a morfina de Tristesse. nós poderíamos andar rasgados pelas ruas ociosas com nosso ócio do descaso pelas coisas que não nos oferecem prazer. seus olhos continuam jabuticabas frescas e suas unhas mal-feitas me provocam cada dia mais. como os olhos de aborto da mãe de Ginsberg, como as conas cobertas de barba negra das garotas profanas, como os dentes quebrados dos pagãos oitentistas, como as redes tristes dos pescadores de lama... eu vou te empanar na areia na primavera, eu vou te mostrar com quantos violões se faz um rock, eu vou fazer amor contigo por telepatia, eu vou me virar do avesso pra te esquentar com minha chama então me chama que o chão é cama pra quem tem pressa em ser amado.    

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Nota sobre Videodrome de David Cronenberg


No ano de 2010 comecei meus estudos sobre a crueldade vinculada ao erotismo e logo descobri, por meio de minha mestra e amiga, que existia um cineasta que trabalha com este mesmo tema em seus filmes, o diretor David Cronenberg. O fato é que procurei muito as películas desse curioso cineasta e não encontrei nada em locadoras ou na Internet. As poucas horas que passo em frente a TV me proporcionaram uma grata surpresa, pois iria passar em um canal de filmes o cultuado Videodrome, filme interessantíssimo do diretor em questão. Marquei na agenda e resolvi assistir, pois previ que seria de imenso valor a experiência.
O filme trata do tema da crueldade e como assinalou o crítico que introduz os filmes no canal, é como se Cronenberg fizesse um reality show do mal, onde as pessoas passam a ter alucinações quando entram em contato com o tal programa que tem o mesmo nome do filme. A história é a seguinte: o diretor de um canal pornográfico assiste a um programa de tortura e assassinatos, que supostamente é veiculado na Malásia e após a experiência passa a sofrer alucinações. Ele procura os produtores e descobre que o programa é produzido nos EUA. De início seu interesse é puramente comercial, pois as cenas o deixaram tão perturbado a ponto de não conseguir parar de assistir mais o horrendo programa e, como um empreendedor, queria veicular o programa em seu canal. A empreitada não tem sucesso, pois logo descobre que se trata de uma seita do mal que deseja manipular as pessoas através do programa, assim como ele mesmo está sendo manipulado. O desenrolar da trama fica a critério do leitor que pode conferir assistindo ao filme.
O que realmente me chamou a atenção no filme não foi a trama, mas o fato do diretor tratar da  crueldade com cenas que extrapolam o próprio programa cruel do qual o filme trata. O que quero dizer é que as cenas das alucinações do diretor de TV são mais cruéis do que o programa que o personagem tanto queria. É um filme que testa o estômago do espectador, mas não a sua paciência, porque o enredo é desenvolvido com muita sabedoria e ação o que torna Videodrome um filme não cansativo, prendendo a atenção daquele que assiste.
Há uma carga de surrealismo no filme, pois como já assinalei, existem muitas cenas de alucinações. O que não se equipara a corrente artística de André Breton é o fato do erotismo não aparecer velado no filme. Consta que Breton pregava em sua formulação acerca do surrealismo um erotismo velado, e além disso, ainda negava qualquer forma de erotismo explicito, creditada certamente a influência que Lautréamont exercia no criador da arte surrealista. Lautréamont, em seu cultuado Cantos de Maldoror, não optou por cenas de sexo explícito, e ainda, optou por poucas cenas de sexo, diga-se de passagem, que me lembro apenas da cena de cópula de Maldoror com a fêmea tubarão. O leitor por ora, pode questionar o porquê estou então assinalando a influência do Surrealismo em Videodrome. Minha afirmação aparece no fato de que a arte surrealista tem uma intima relação com a psicologia, principalmente no que diz respeito a simulação de estados de loucura. Consta que Breton e outros surrealistas simularam a loucura para escreverem suas obras. Passo agora a algumas considerações sobre os estados de loucura do diretor de TV no filme.
O diretor descobre, como já foi dito, que passou a sofrer alucinações após ter contato com o programa Videodrome. Essas alucinações são mostradas ao espectador do filme sem nenhum indicio prévio, por mudança de luz ou algo do tipo, como ocorre na maior parte dos filmes. Isso provoca um prévio não entendimento por parte do espectador, que não sabe se o fato ocorreu ou não. Esse não entendimento é de fato uma experiência cruel não só para o personagem, mas também para aquele que acompanha sua história. O que pode ilustrar essa consideração é o conceito dado por Clément Rosset em O principio de crueldade, onde o filósofo afirma que existem vários tipos de crueldade e um deles é o da realidade do amor. A crueldade da realidade do amor, em minha leitura, se dá a partir do ponto em que o amante não tem certeza plena (me arrisco até mesmo a dizer que o amante não tem certeza nenhuma), da realidade do amor em seu parceiro. Portanto, me leva a crer que a crueldade se dá no amor a partir da incerteza. Se, então, a incerteza é um tipo de crueldade no amor, também pode ser um tipo de crueldade para aquele que entra em contato com alguma obra de arte seja ela literária, cinematográfica ou qualquer uma delas. Incerteza e não entendimento são duas experiências tão cruéis quanto aquela que nos faz sofrer na carne. No que diz respeito ao erotismo, posso afirmar que incerteza e não entendimento também fazem parte deste, pois o parceiro sofre com a incerteza de ter ou não dado prazer a sua parceira e vice-versa. Os amantes sofrem de não entendimento quando não sabem o porquê sentem prazer com certas práticas consideradas sujas ou imorais para a maioria e assim por diante. No filme isso fica claro quando o protagonista se vê em um relacionamento em que o prazer é associado a dor, já que sua parceira pede que ele a corte ou a fure na cena mais erótica do filme. Ele não consegue entender o porquê desse prazer e sofre também porque sente prazer em proporcionar a ela essas práticas consideradas até mesmo por ele degradantes.
Essas considerações deixam em evidência a carga erótico-cruel do filme e ainda que o erótico estabelece na história uma relação intima com a crueldade. Posso, portanto, afirmar que fora do campo da arte o erótico também estabelece relações com o cruel. Um exemplo claro disso é o erotismo homossexual que, por vezes, fere a moral cristã de que o homem foi feito para a mulher e a mulher foi feita para o homem. O erotismo homossexual é considerado então, uma transgressão, uma infração aos bons costumes. Cruel para o próprio homossexual e para os espectadores desse erotismo que acabam por conter seus desejos licenciosos, ou por esconder sua opção sexual. Para não ficar em apenas um exemplo posso ilustrar essa relação de crueldade/erotismo com as práticas sadomasoquistas ou escatológicas. Essas por não fazerem parte do acervo sexual “dos normais” acabam por ser não somente cruéis por abordarem a dor física, ou a proporção da mesma no outro, mas pela “anormalidade” com que se dão acabam por habitar um mundo clandestino, destinado apenas aos que optam por tais práticas. O filme em questão habita esse mundo clandestino das relações sadomasoquistas sem adentrar afundo, pois é na verdade um filme que trata de uma história surreal na qual os humanos seriam manipulados por um programa onde a realidade sadomasoquista é mostrada. Gostaria de encerrar com uma questão pertinente ao mundo contemporâneo: alguma realidade sadomasoquista não relacionada ou relacionada ao sexo é mostrada em nossos modernos reality shows?    

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Pequenas iluminações noturnas

“eles ainda não sabem que o prazer é a maior representação da vida”

     


Uma luva vermelha me acerta em cheio a maçã do rosto. Ela sorri como quem diz: não queria acertar tua maçã. Masoquefazeragoraqueelasorripramim? Beijo. Ela sorri novamente. Ela sempre sorri como quem pede perdão. Acerto delicadamente sua testa oleosa cheia de cravos e espinhas. Ela me acerta o peito.
                                Não seria mesmo o amor uma luta?
E nós caminhamos pela casa lutando um boxe familiar de socos intercalados com beijos. Nunca havíamos nos beijado antes, seu hálito me lembrava o gosto de pêssegos frescos colhidos no pé após amar secretamente na inocência infantil: os pêssegos desta forma têm o sabor das maçãs.
                                Não seria o amor a perda de si, ou seria o livramento?

Um carro a cem por hora. Um carro chumbo como todos os carros chumbos. Nossa família voando baixo para fugir da solidão que ataca a todas as famílias. Paramos frente a uma igreja branca. É que as igrejas dessas pequenas cidades de interior são sempre brancas como a imensa barba de Deus. (Deveria eu pedir perdão por todos esses anos de blasfêmias de putaria de poligamia e de tudo aquilo eu um bom cristão não deve fazer? Ainda tem o álcool, de vez em quando a maconha, uns milhares de cigarros após as transas e ainda as milhares de punhetas que toco pensando em aventuras sexuais que nunca terei).

A igreja branca rodeada por uma feira. Uma feira igual a todas as feiras dessas pequenas cidades do interior. As barracas de doces. As barracas de enfeites ridículos. As barracas de pastéis. As barracas sempre vendem tudo. Entre nossa família e as barracas: um poço. Nós andaríamos entre as barracas (como caranguejos que somos) em busca de alguma chama para reatar os nossos laços: entre nossa família e nós mesmos: um poço.

Um cara se aproxima de mim. Um cara como todos os caras dessas pequenas cidades do interior. Olho. Seus olhos são escandalosos. Ele me pede fogo. Meio desconfiado coloco a mão direita no bolso, não encontro nada. No esquerdo. Ah, sim. Toma aqui parceiro. Ele coloca a mão direita em uma bolsa de couro. Uma grande bolsa lateral de couro cru, como as bolsas feias que eles vendem nessas pequenas feiras de cidades pequenas. Deve ser só mais um hippie. Retira um frasco de vidro. Acho que ele vai tomar um gole antes de fumar. Ele me olha. Olho o pequeno frasco em suas mãos. Seus olhos ainda continuam em chamas. Penso que deveria ter lhe negado o fogo. Olho para o seu membro apertado dentro de uma calça de algodão também cru. Vejo que seu membro está ereto. Um grande membro ereto com a cabeça querendo fugir da calça. Mas o que será que esse cara ta pensado porra. De pinto duro no meio da praça assim sem mais nem menos? Vejo de relance que ele vira o pequeno frasco em cima dos doces.

Fogo!!!!!!!!!!

 Uma maçã-do-amor torrada. Uma maçã-do-amor ardendo em chamas. Várias maçãs-do-amor ardendo em chamas. Ele me persegue com o frasco de líquido inflamável. Eu corro desesperadamente em direção a igreja. Os anjos do senhor não virão me ajudar. Eles não me carregaram para um lugar distante e seguro. Não existem lugares seguros nas cidades pequenas. Não existem anjos nas pequenas iluminações noturnas. Corri desesperadamente sabendo que nenhum anjo apareceria com cordas divinas para me levar em um vôo seguro. As maçãs-do-amor explodem e ele sorri contente mostrando o vazio de alguns dentes que faltam em sua imunda boca.   

Eu estou deitado. Ela se posiciona sobre mim. Ela me dá boas bofetadas na cara. Sinto instantaneamente seu buraco sobre meu membro. Um quente e peludo buraco sobre meu membro. Eu sei disso mesmo ela ainda de calção. Mesmo sabendo que ela não queria nada além de uma boa luta de boxe. Não consigo me conter. Ela sorri quando sente meu membro crescendo sob seu buraco. Ela me beija longamente. E começa a se esfregar em mim. Eu gozo mesmo sem penetrá-la. Ela sorri. E tira seu calção de luta assim sobre minha cabeça, e vejo sua calcinha toda molhada. Ela se senta sobre minha cabeça, mas não deixa que eu tire sua calcinha. Diz ainda ser virgem. Ela se esfrega em minha boca. Coloco a língua com toda a força possível. Ela goza. Ela se veste e saí. Antes de sair me dá mais umas bofetadas. Eu fico estirado no chão frio com o membro duro. Com vontade de apanhar mais daquela infame lutadora. Tentei sorrir para demonstrar afeto. Ela já não me olhava. Restava agora me satisfazer sozinho com o cheiro tenro de seu sexo misturado com o algodão de sua calcinha em minha boca.

As pessoas saem correndo da igreja. Muitas pessoas. Parece-me que são milhares. Eu não sei contar a multidão.  Uma garota cega corre sem tropeçar. Os cegos sempre tropeçam, mas ela não, ela conhece bem o caminho da igreja. Ela corre em direção ao fogo. Em desespero tento conte-la, mas ela passa abaixo de minhas axilas e corre em direção ao fogo. O fogo toma conta de seu minúsculo vestido. A menina se torna uma bola de fogo cega. E menina grita e corre sem direção. As pessoas choram. A menina morre. Eu pergunto para um índio meio bêbado onde fica o puteiro. Ele diz que me levará até lá. Eu sorrio e o sigo. Acordo. Bato com força sobre uma vela ao lado da cama.  porque por um instante senti que a menina de fogo me abraçava pedindo ajuda.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Algumas faíscas duram mais do que segundos

Enquanto ela tomava sua ultima dose do veneno
Ele vomitava moscas no jardim
Os coelhos eram abortados
                            compusivamente por toda a humanidade
Seus olhos ainda não sangram, honey,
Eu quero te comer à milanesa
Eu quero um colchão em chamas
Eu sou uma palmatória nos seus olhos
Eu sou um quilometro quadrado de libido
Me dê alguma coisa mais amarga
Me dê seu coração ferido com agulha
Mostre sua mão
Jogue as meias das garrafas da janela
Por que você não se droga comigo?

E desde que choramos e mijamos juntos
Você é uma alucinação nos meus olhos latinos
Eu quero sua mão na cabeceira da cama
Eu quero sua poção de amor-dos-deuses-gregos
Eu sou um anarquista montado num foguete de cólera
Eu sou um parasita nos seus sonhos de volúpia


Por que você insiste em não me dar o seu rabinho, honey,
Eu posso te fazer sangrar na ponte
Eu posso arrancar seu fígado inflamado
Raspe a barba negra que envolta sua vagina
Meu amor doente
Meu amor de fome

Eu tenho gula em comer-te,
eu quero te comer a céu aberto,
Eu quero te fazer um filho um neto.
Pule da ponte e caia de cabeça numa pedra pomes
Você não leu Allen Ginsberg?
Você não foi a Argentina dançar tango e comer paejas
Você não sabe nada da vida porque sempre nega
quando ofereço minha dose conhaque
seus olhos são duas amoras prontas para serem lambidas
seus pés são o que mais desejo
não quero rasgar suas roupas íntimas
não quero abortar meu feto pútrido
cansei de fingir não estar grávido
cansei de fingir que não te desejo mais do que Zeus
cansei de muitas coisas
menos do cheiro que sua vagina exala quando
você dança sambamaxixexaxado em cima do meu caralho
então dança que eu te danço e te mostro
o pau a pino cheio de fel
a luz que transborda do meu céu. 

segunda-feira, 4 de abril de 2011

pomba-gira do absoluto

I

Eu sou uma metralhadora em estado de graça

Roberto Piva


Imensa boca submersa
Quando teus dentes pagãos soprarão canções malditas?
Quando tua língua libertina lamberá meu crânio?
Vejo a baba que escorre na tua gengiva
Como de uma vulva raspada a navalha

Fostes tu quem me engolistes para o inferno
Imensa boca,
Eu não saberia cantar o ódio a não ser de tua garganta,
           Por que tu me comoves?
Por que teu céu é tão cinza?

Eu caminhei sobre os poros de tua língua,
E afaguei tuas cáries latinas
 Tua imensidão sacrifica minha alma
Eu sei de tuas mentiras
De tuas salivas verdes escorrendo sobre o tapete vermelho

Eu poderia te amar como um acéfalo
Eu poderia fingir que tu não existes,
                       Mas continuo nu após as refeições
Eu sou o que te engasga e o que te adora

Eu sou o sacrifício da mais pura beleza,
Porque herdei tua pomba-gira-da-desgraça
Por que herdei tua desconfiança nos homens.



II



luva de pelica grudada no parapeito da discórdia
um protótipo de deus dança desgraçadamente
eu sou uma imitação em revolta
                uma arma contra os castrados da justiça
você poderia viver salgando as asas dos anjos
                matando matando matando
como um personagem de Masculino Feminino.
Deus abriu a porta do céu ao pederasta
           O diabo vomitou sobre minha roupa limpa
Eu posso confiar na discórdia,
     Mas não nas garotas comedidas
comidas por pequeninos falos de seus amantes meio brochas.

segunda-feira, 28 de março de 2011

I'll leave my jacket to keep you warm
That's all that I can do
precisas adormecer teus demônios
& deixar
                 que eu deslize em teu corpo.
precisas te entregar na noite insana.
Quero roubar teu sono virgem:
              Quero escrever minha gula em teu ventre:
Quero adormecer com teu cheiro suave
de após a dor: o prazer.

poderia matar teus demônios.
poderia estrangular tua falsa inocência.

O amor é pagão.
Os demônios são
                 santos dependurados em tuas ancas.

Precisas adormecer em meu peito

& fazer dele tua casa
depois que eu roubar tuas asas.

sexta-feira, 25 de março de 2011

Aos deuses que nasceram nas latrinas

I

“Olhai o cintilante conteúdo das latrinas”

Roberto Piva

Olhos de Velásquez teu corpo arderá em brasa nessa noite que escorre noturna como uma leucemia em nosso suor latino. Após me deleitar com seus cabelos de medusa, arrancarei teus olhos e te farei uma mondigliana Eu quero me banhar em sonetos noturnos de Jorge de Lima e tomar conhaque com naftalina fosforescente em mil tons agudos de Schumman. Assim como os violoncelos eu torcerei o teu pescoço nu e habitarei para sempre teus pesadelos e a tua boca inflamada. Descerei por tua garganta como um faraó maldito e em seu intestino recitarei poemas de Rimbaud. Assumirei a posição fetal e renascerei cagado em um sábado cinza que tu nunca esquecerás nem o modo libertino como sairei galopando em um pônei com asas de morcego cantarolando libertango e alimentando os fantasmas absolutos que se formam nas latrinas entupidas.    

Dedicado à Olhos de Velásquez

II

Os porcos mutilados comem as flores do jardim da América enquanto somos todos acometidos pela crise epilética da asfixia absoluta. Não tomarei este copo de poeira e sangue verde Não comerei orelhas de padres grelhadas no jantar. Centenas de ovos de codornas foram plantados nos cus dos hermafroditas utópicos enquanto putas sádicas corriam pela noite com seus chicotes de chacina. Escreverei meu nome com gilete nas tuas costas nuas esta noite. Lambendo cada gota de teu suor misturado com câncer e enfiando as chaves de deus no teu rim para abrir as portas de teu intestino. Não te preocupes não tenhas medo eu sou piedoso eu sou meio broxa eu sou meio afetado pela crise diabólica do capital. Escuto rock nas quintas à noite, mas sexta é samba. Quase morri com conjuntivite mas renasci no sábado em meio a neblina blasfematória me masturbando sobre o cinzeiro. Eu sou meio deus mas não sei perdoar. poderia te abraçar agora e te fazer sumir da terra te acoplando no meu peito. Vou espetar um milhão de pregadores na tua carcaça e te colocarei ao sol para ver a tua alma morrer de câncer de pele.

III

“contra tudo que não for loucura
ou poesia”

Jorge de Lima


Auto retrato de Mondigliani. Olhos marrons como cor de bosta nova. Antonia com tua cara de maçã. Retratos de mondigliani com seus olhos transpassados pela angustia. Não há solução. Nós morreremos de tédio cortando cebolas aos domingos sem fazer pactos macabros ou trapaças.

             Os deuses já se prostituíram
O amor é uma lenda no teu coração.

IV

Nós adentramos o mundo da magia pelo teu rim amaldiçoado. Os corações foram guardados em caixas de gelo seco & nosso espetáculo trashman arderá quando soarem as harpas dionisíacas. Elas começaram por comer toda a merda da vida elas começarão por convencer a todos a levarem adiante a merda da vida. Hoje entraremos nos casulos dos teus seios, amanhã sairemos borboletas mortíferas e promiscuas. Amanhã compactuaremos com as religiões indígenas. Faremos festas aos nossos totens, orgias/ cem mil orgias/ o mundo espetaculoso das drogas ilícitas nos espera. A paixão          febre contaminosa          dilacerando os corações amorfinados nós queremos mil paixões e menos tédio. Nós preferimos a crueldade dos mafiosos À burocracia dos funcionários. Nós louvamos os banheiros públicos e seu silêncio frente às taras libertinas. é necessário esquecer que há o futuro e celebrar com paixão o ócio e a selvageria.

V

Ao som de Waka/Jawaka de Frank Zappa

Tua alma tem mil isqueiros onde a noite arde. Teu cérebro goteja na retina das putas de família. Peça a benção ao deus ensurdecedor Escute o seu coração bater em mil em mil macumbas nos terreiros das periferias perdidos entre os amores não vividos. Nossa noite no inferno nunca teve um fim nossa noite no inferno é uma bênção ao coração contaminado pela bondade. Ouço soar as trombetas de Dionísio vejo Adriano, o imperador, encolhido num canto de um quarto escuro com uma rosa de espinhos enfiada no cú lembrando o deus menino afogado na beira do Nilo. Não há suor bastante para conter a nossa angústia. Nossa noite no inferno nunca teve fim.

VI

Vem buscar-me que ainda sou teu. E se você entrasse no quarto da minha alma com jabuticabas frescas e amoras espremidas no olho que já não vê eu te amaria ainda uma vez? Vem buscar-me que ainda sou teu: e te desejo, como se te perdesse para uma cabra fétida (reflexos de Kosisnki em seu Pássaro Pintado), e eu te desejo como um assassino à vitima. E se você entrasse na avarandado do meio peito iluminada pela discórdia eu te abraçaria como se a ultima vez, e sim ela seria, porque depois do afago: a dor. e o punhal já estaria em minha mão esquerda pronto para invadir o teu corpo virgem por uma única vez. Vem buscar-me que ainda sou teu...

Após Coração Materno, Vicente Celestino,
a canção que leva a crueldade humana à prova. 






quinta-feira, 24 de março de 2011

navio ancorado no espaço




“que tivesse um blue.
isto é
imitasse feliz
a delicadeza, a sua,
assim como um tropeço
que mergulha surdamente
no reino expresso
do prazer...”

Ana C.


recorto do teu corpo nu
            só, a parte,
e à outra parte fica o breu
eu li no teu bloco novo
          o teu coração ateu,
ali, ele, jogado a meus pés
e teu corpo quis ter asas
o meu, marés.  



E querer




Queria que um só olhar meu fizesse crescer urtigas por sobre tua cama e que você não dormisse mais longe de meu corpo, esse meu corpo, no qual sou um efêmero estrangeiro. Queria te fazer virar do avesso num estralar de dedos e morder suas celulites das coxas com meu dentinho de ouro e te cobrir de pétalas de petúnias de esmeraldas de ametistas...

E a manhã flameja no universo inteiro que é o seu sorriso e meu sexo não é dócil, pode ser teu paraíso...