terça-feira, 31 de maio de 2011

algumas palavras para não sabotar o nosso amor singelo

Postulados flácidos. Eu que quis te ter assim e mesmo e sempre. você foi embora no carro a 40 kms por hora e eu fiquei ali imóvel na neblina que começa a jorrar sobre nossos corpos naquela manhã de maio. E maio estava acabando e anunciava o começo de junho e de mais um mês a seu lado. os Andes acho que ficam para o ano que vem, nós não temos dinheiro, nós não temos praticamente nada a não ser uma cama quebrada, alguns livros que guardo comigo, alguns cigarros que fumamos durante o fim de semana guardados num copo, uma cuia que nunca usamos e que fica sobre a escrivaninha em que lemos e comentamos nossas leituras um para o outro, uns poucos cotonetes rosados, e alguma vontade de estar sempre por perto um do outro. Você foi ali com aquele carro que eu te dei. Eu guardo algumas notas para você, eu guardo alguns sorrisos e algumas carícias para não sabotar o nosso amor singelo. Nós estávamos ali naquela manhã do ultimo dia de maio. E não havia flores e eu deixei o carro em suas mãos e você ficou ali esperando que eu tivesse alguma carona ou algo do tipo para fugir do mundo que tanto adoramos. Eu te quero cada vez mais e te espero por ali parado no cais, no porto, louco de vontade que você chegue e se achegue logo no peito.  

terça-feira, 24 de maio de 2011

Baco dança
um tango num filme de Pasolini
                      ele que te queria manco,
ela que fuma pelos cantos
                 os versos, os prantos,
     & eu que te quero tanto
almoço, janto
na cabeça da anta
“o movimento dos quadris febris”
os movimentos organizados
para subverter o pudor
                            o fervor,
                                 o amor
                                     quero comer tua mão
                                            quero ser tua oração
                                       aos sábados.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Fragmento I


a vida, baby, passa tenderosa:


 o vinho dentro da garrafa, o sangue dentro do corpo entre outras coisas calmas. você não é uma alucinação, é uma estrela-peixe no meu aquário em saturno. o vinho escorrendo no sangue. baby, o tempo passa calmo e nem um mundo adulto será capaz de nos tornar rançosos como aqueles senhores e suas gastrites hemorróidas sangue-água. nós seguimos à galope nos cavalos da rebeldia seguindo a risca os preceitos básicos rimbaudianos, usando referências bêbadas e levando em nossos olhos a morfina de Tristesse. nós poderíamos andar rasgados pelas ruas ociosas com nosso ócio do descaso pelas coisas que não nos oferecem prazer. seus olhos continuam jabuticabas frescas e suas unhas mal-feitas me provocam cada dia mais. como os olhos de aborto da mãe de Ginsberg, como as conas cobertas de barba negra das garotas profanas, como os dentes quebrados dos pagãos oitentistas, como as redes tristes dos pescadores de lama... eu vou te empanar na areia na primavera, eu vou te mostrar com quantos violões se faz um rock, eu vou fazer amor contigo por telepatia, eu vou me virar do avesso pra te esquentar com minha chama então me chama que o chão é cama pra quem tem pressa em ser amado.    

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Nota sobre Videodrome de David Cronenberg


No ano de 2010 comecei meus estudos sobre a crueldade vinculada ao erotismo e logo descobri, por meio de minha mestra e amiga, que existia um cineasta que trabalha com este mesmo tema em seus filmes, o diretor David Cronenberg. O fato é que procurei muito as películas desse curioso cineasta e não encontrei nada em locadoras ou na Internet. As poucas horas que passo em frente a TV me proporcionaram uma grata surpresa, pois iria passar em um canal de filmes o cultuado Videodrome, filme interessantíssimo do diretor em questão. Marquei na agenda e resolvi assistir, pois previ que seria de imenso valor a experiência.
O filme trata do tema da crueldade e como assinalou o crítico que introduz os filmes no canal, é como se Cronenberg fizesse um reality show do mal, onde as pessoas passam a ter alucinações quando entram em contato com o tal programa que tem o mesmo nome do filme. A história é a seguinte: o diretor de um canal pornográfico assiste a um programa de tortura e assassinatos, que supostamente é veiculado na Malásia e após a experiência passa a sofrer alucinações. Ele procura os produtores e descobre que o programa é produzido nos EUA. De início seu interesse é puramente comercial, pois as cenas o deixaram tão perturbado a ponto de não conseguir parar de assistir mais o horrendo programa e, como um empreendedor, queria veicular o programa em seu canal. A empreitada não tem sucesso, pois logo descobre que se trata de uma seita do mal que deseja manipular as pessoas através do programa, assim como ele mesmo está sendo manipulado. O desenrolar da trama fica a critério do leitor que pode conferir assistindo ao filme.
O que realmente me chamou a atenção no filme não foi a trama, mas o fato do diretor tratar da  crueldade com cenas que extrapolam o próprio programa cruel do qual o filme trata. O que quero dizer é que as cenas das alucinações do diretor de TV são mais cruéis do que o programa que o personagem tanto queria. É um filme que testa o estômago do espectador, mas não a sua paciência, porque o enredo é desenvolvido com muita sabedoria e ação o que torna Videodrome um filme não cansativo, prendendo a atenção daquele que assiste.
Há uma carga de surrealismo no filme, pois como já assinalei, existem muitas cenas de alucinações. O que não se equipara a corrente artística de André Breton é o fato do erotismo não aparecer velado no filme. Consta que Breton pregava em sua formulação acerca do surrealismo um erotismo velado, e além disso, ainda negava qualquer forma de erotismo explicito, creditada certamente a influência que Lautréamont exercia no criador da arte surrealista. Lautréamont, em seu cultuado Cantos de Maldoror, não optou por cenas de sexo explícito, e ainda, optou por poucas cenas de sexo, diga-se de passagem, que me lembro apenas da cena de cópula de Maldoror com a fêmea tubarão. O leitor por ora, pode questionar o porquê estou então assinalando a influência do Surrealismo em Videodrome. Minha afirmação aparece no fato de que a arte surrealista tem uma intima relação com a psicologia, principalmente no que diz respeito a simulação de estados de loucura. Consta que Breton e outros surrealistas simularam a loucura para escreverem suas obras. Passo agora a algumas considerações sobre os estados de loucura do diretor de TV no filme.
O diretor descobre, como já foi dito, que passou a sofrer alucinações após ter contato com o programa Videodrome. Essas alucinações são mostradas ao espectador do filme sem nenhum indicio prévio, por mudança de luz ou algo do tipo, como ocorre na maior parte dos filmes. Isso provoca um prévio não entendimento por parte do espectador, que não sabe se o fato ocorreu ou não. Esse não entendimento é de fato uma experiência cruel não só para o personagem, mas também para aquele que acompanha sua história. O que pode ilustrar essa consideração é o conceito dado por Clément Rosset em O principio de crueldade, onde o filósofo afirma que existem vários tipos de crueldade e um deles é o da realidade do amor. A crueldade da realidade do amor, em minha leitura, se dá a partir do ponto em que o amante não tem certeza plena (me arrisco até mesmo a dizer que o amante não tem certeza nenhuma), da realidade do amor em seu parceiro. Portanto, me leva a crer que a crueldade se dá no amor a partir da incerteza. Se, então, a incerteza é um tipo de crueldade no amor, também pode ser um tipo de crueldade para aquele que entra em contato com alguma obra de arte seja ela literária, cinematográfica ou qualquer uma delas. Incerteza e não entendimento são duas experiências tão cruéis quanto aquela que nos faz sofrer na carne. No que diz respeito ao erotismo, posso afirmar que incerteza e não entendimento também fazem parte deste, pois o parceiro sofre com a incerteza de ter ou não dado prazer a sua parceira e vice-versa. Os amantes sofrem de não entendimento quando não sabem o porquê sentem prazer com certas práticas consideradas sujas ou imorais para a maioria e assim por diante. No filme isso fica claro quando o protagonista se vê em um relacionamento em que o prazer é associado a dor, já que sua parceira pede que ele a corte ou a fure na cena mais erótica do filme. Ele não consegue entender o porquê desse prazer e sofre também porque sente prazer em proporcionar a ela essas práticas consideradas até mesmo por ele degradantes.
Essas considerações deixam em evidência a carga erótico-cruel do filme e ainda que o erótico estabelece na história uma relação intima com a crueldade. Posso, portanto, afirmar que fora do campo da arte o erótico também estabelece relações com o cruel. Um exemplo claro disso é o erotismo homossexual que, por vezes, fere a moral cristã de que o homem foi feito para a mulher e a mulher foi feita para o homem. O erotismo homossexual é considerado então, uma transgressão, uma infração aos bons costumes. Cruel para o próprio homossexual e para os espectadores desse erotismo que acabam por conter seus desejos licenciosos, ou por esconder sua opção sexual. Para não ficar em apenas um exemplo posso ilustrar essa relação de crueldade/erotismo com as práticas sadomasoquistas ou escatológicas. Essas por não fazerem parte do acervo sexual “dos normais” acabam por ser não somente cruéis por abordarem a dor física, ou a proporção da mesma no outro, mas pela “anormalidade” com que se dão acabam por habitar um mundo clandestino, destinado apenas aos que optam por tais práticas. O filme em questão habita esse mundo clandestino das relações sadomasoquistas sem adentrar afundo, pois é na verdade um filme que trata de uma história surreal na qual os humanos seriam manipulados por um programa onde a realidade sadomasoquista é mostrada. Gostaria de encerrar com uma questão pertinente ao mundo contemporâneo: alguma realidade sadomasoquista não relacionada ou relacionada ao sexo é mostrada em nossos modernos reality shows?    

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Pequenas iluminações noturnas

“eles ainda não sabem que o prazer é a maior representação da vida”

     


Uma luva vermelha me acerta em cheio a maçã do rosto. Ela sorri como quem diz: não queria acertar tua maçã. Masoquefazeragoraqueelasorripramim? Beijo. Ela sorri novamente. Ela sempre sorri como quem pede perdão. Acerto delicadamente sua testa oleosa cheia de cravos e espinhas. Ela me acerta o peito.
                                Não seria mesmo o amor uma luta?
E nós caminhamos pela casa lutando um boxe familiar de socos intercalados com beijos. Nunca havíamos nos beijado antes, seu hálito me lembrava o gosto de pêssegos frescos colhidos no pé após amar secretamente na inocência infantil: os pêssegos desta forma têm o sabor das maçãs.
                                Não seria o amor a perda de si, ou seria o livramento?

Um carro a cem por hora. Um carro chumbo como todos os carros chumbos. Nossa família voando baixo para fugir da solidão que ataca a todas as famílias. Paramos frente a uma igreja branca. É que as igrejas dessas pequenas cidades de interior são sempre brancas como a imensa barba de Deus. (Deveria eu pedir perdão por todos esses anos de blasfêmias de putaria de poligamia e de tudo aquilo eu um bom cristão não deve fazer? Ainda tem o álcool, de vez em quando a maconha, uns milhares de cigarros após as transas e ainda as milhares de punhetas que toco pensando em aventuras sexuais que nunca terei).

A igreja branca rodeada por uma feira. Uma feira igual a todas as feiras dessas pequenas cidades do interior. As barracas de doces. As barracas de enfeites ridículos. As barracas de pastéis. As barracas sempre vendem tudo. Entre nossa família e as barracas: um poço. Nós andaríamos entre as barracas (como caranguejos que somos) em busca de alguma chama para reatar os nossos laços: entre nossa família e nós mesmos: um poço.

Um cara se aproxima de mim. Um cara como todos os caras dessas pequenas cidades do interior. Olho. Seus olhos são escandalosos. Ele me pede fogo. Meio desconfiado coloco a mão direita no bolso, não encontro nada. No esquerdo. Ah, sim. Toma aqui parceiro. Ele coloca a mão direita em uma bolsa de couro. Uma grande bolsa lateral de couro cru, como as bolsas feias que eles vendem nessas pequenas feiras de cidades pequenas. Deve ser só mais um hippie. Retira um frasco de vidro. Acho que ele vai tomar um gole antes de fumar. Ele me olha. Olho o pequeno frasco em suas mãos. Seus olhos ainda continuam em chamas. Penso que deveria ter lhe negado o fogo. Olho para o seu membro apertado dentro de uma calça de algodão também cru. Vejo que seu membro está ereto. Um grande membro ereto com a cabeça querendo fugir da calça. Mas o que será que esse cara ta pensado porra. De pinto duro no meio da praça assim sem mais nem menos? Vejo de relance que ele vira o pequeno frasco em cima dos doces.

Fogo!!!!!!!!!!

 Uma maçã-do-amor torrada. Uma maçã-do-amor ardendo em chamas. Várias maçãs-do-amor ardendo em chamas. Ele me persegue com o frasco de líquido inflamável. Eu corro desesperadamente em direção a igreja. Os anjos do senhor não virão me ajudar. Eles não me carregaram para um lugar distante e seguro. Não existem lugares seguros nas cidades pequenas. Não existem anjos nas pequenas iluminações noturnas. Corri desesperadamente sabendo que nenhum anjo apareceria com cordas divinas para me levar em um vôo seguro. As maçãs-do-amor explodem e ele sorri contente mostrando o vazio de alguns dentes que faltam em sua imunda boca.   

Eu estou deitado. Ela se posiciona sobre mim. Ela me dá boas bofetadas na cara. Sinto instantaneamente seu buraco sobre meu membro. Um quente e peludo buraco sobre meu membro. Eu sei disso mesmo ela ainda de calção. Mesmo sabendo que ela não queria nada além de uma boa luta de boxe. Não consigo me conter. Ela sorri quando sente meu membro crescendo sob seu buraco. Ela me beija longamente. E começa a se esfregar em mim. Eu gozo mesmo sem penetrá-la. Ela sorri. E tira seu calção de luta assim sobre minha cabeça, e vejo sua calcinha toda molhada. Ela se senta sobre minha cabeça, mas não deixa que eu tire sua calcinha. Diz ainda ser virgem. Ela se esfrega em minha boca. Coloco a língua com toda a força possível. Ela goza. Ela se veste e saí. Antes de sair me dá mais umas bofetadas. Eu fico estirado no chão frio com o membro duro. Com vontade de apanhar mais daquela infame lutadora. Tentei sorrir para demonstrar afeto. Ela já não me olhava. Restava agora me satisfazer sozinho com o cheiro tenro de seu sexo misturado com o algodão de sua calcinha em minha boca.

As pessoas saem correndo da igreja. Muitas pessoas. Parece-me que são milhares. Eu não sei contar a multidão.  Uma garota cega corre sem tropeçar. Os cegos sempre tropeçam, mas ela não, ela conhece bem o caminho da igreja. Ela corre em direção ao fogo. Em desespero tento conte-la, mas ela passa abaixo de minhas axilas e corre em direção ao fogo. O fogo toma conta de seu minúsculo vestido. A menina se torna uma bola de fogo cega. E menina grita e corre sem direção. As pessoas choram. A menina morre. Eu pergunto para um índio meio bêbado onde fica o puteiro. Ele diz que me levará até lá. Eu sorrio e o sigo. Acordo. Bato com força sobre uma vela ao lado da cama.  porque por um instante senti que a menina de fogo me abraçava pedindo ajuda.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Algumas faíscas duram mais do que segundos

Enquanto ela tomava sua ultima dose do veneno
Ele vomitava moscas no jardim
Os coelhos eram abortados
                            compusivamente por toda a humanidade
Seus olhos ainda não sangram, honey,
Eu quero te comer à milanesa
Eu quero um colchão em chamas
Eu sou uma palmatória nos seus olhos
Eu sou um quilometro quadrado de libido
Me dê alguma coisa mais amarga
Me dê seu coração ferido com agulha
Mostre sua mão
Jogue as meias das garrafas da janela
Por que você não se droga comigo?

E desde que choramos e mijamos juntos
Você é uma alucinação nos meus olhos latinos
Eu quero sua mão na cabeceira da cama
Eu quero sua poção de amor-dos-deuses-gregos
Eu sou um anarquista montado num foguete de cólera
Eu sou um parasita nos seus sonhos de volúpia


Por que você insiste em não me dar o seu rabinho, honey,
Eu posso te fazer sangrar na ponte
Eu posso arrancar seu fígado inflamado
Raspe a barba negra que envolta sua vagina
Meu amor doente
Meu amor de fome

Eu tenho gula em comer-te,
eu quero te comer a céu aberto,
Eu quero te fazer um filho um neto.
Pule da ponte e caia de cabeça numa pedra pomes
Você não leu Allen Ginsberg?
Você não foi a Argentina dançar tango e comer paejas
Você não sabe nada da vida porque sempre nega
quando ofereço minha dose conhaque
seus olhos são duas amoras prontas para serem lambidas
seus pés são o que mais desejo
não quero rasgar suas roupas íntimas
não quero abortar meu feto pútrido
cansei de fingir não estar grávido
cansei de fingir que não te desejo mais do que Zeus
cansei de muitas coisas
menos do cheiro que sua vagina exala quando
você dança sambamaxixexaxado em cima do meu caralho
então dança que eu te danço e te mostro
o pau a pino cheio de fel
a luz que transborda do meu céu.